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Blow up, depois daquele beijo - sucesso na década de 1960, o clássico de Antonioni hoje divide opini

Confira as críticas de três alunos do curso de Jornalismo do UniCEUB.



Estourem-me os miolos

Por Vitor Albuquerque, sexto semestre


Movimento e percepção. Vivemos em um mundo onde a globalização tomou proporções enormes, e a velocidade entre as conexões também acompanhou esse crescimento. Estamos acostumados, no século XXI, a filmes extremamente rápidos, explosões e acontecimentos brutais, a hora toda. Giros, rapidez, trama, encontros e desencontros... Portanto, a emblemática história do fotógrafo de moda londrino Thomas pode ser pouco agraciada pelo público atual, pois hoje ficou complicado assistir a esse tipo de produção. Os acontecimentos são muito lentos para os dias atuais. Pode ser que o nosso cérebro automaticamente rejeite, chame de chato e classifique como filme de “dar sono”.

Entretanto, há um outro ponto: o filme é complexo e dotado de uma sensibilidade forte. Mesmo amantes do cinema têm uma certa dificuldade em destrinchá-lo. A ideia é genial, assim como a fotografia. A minha parte favorita é quando Thomas vai a um concerto de Rock. The Yardbirds estão quebrando tudo no palco, mas, espantosamente, todo o público está estático. Parado. Observa. Há quem diga que a ideia é representar exatamente a foto, pois, assim que é tirada, permanece em completa estagnação. O público somente se movimenta quando o guitarrista Jeff Beck replica uma apresentação da banda The Who, em que Peter Townshend quebra a guitarra nos amplificadores.

Beck joga o braço da guitarra para o público. Thomas, ao perceber a importância daquilo, entra na guerra para roubar o pedaço do instrumento. Depois de muita atrocidade, ele consegue ficar com o objeto mas, assim que sai da apresentação, joga fora. Muitas dúvidas surgem nesse momento. Para os especialistas que analisaram o filme na projeção do dia 5 de junho, no Cine UniCEUB, isso retrata a perda da importância de algo a partir do momento em que não mais desperta o interesse de outrem. Portanto, Thomas o abandona no chão, numa rua suja da Londres sessentista.

O grande quê do filme não se passa nas telas, mas na mente confusa de Thomas a respeito das fotos de um possível assassinato no parque. Embasbacado com a descoberta, ele passa a buscar informações para comprovar a própria sanidade. Houve assassinato? Houve mulher no parque? O que separa a loucura da miragem? São as miragens loucuras? Ou a loucura as cria? Ou ainda: será realidade?

O filme, magnificamente, cria um universo novo, repleto de mensagens metafóricas que trazem à tona a representação da realidade pela fotografia. Afinal, até onde o que é captado pelos eixos ópticos condiz com o espectro da realidade?


A metalinguagem de Blow up

Por João Vitor Silva, sétimo semestre


Inspirado no conto "As Babas do Diabo", do argentino Julio Cortázar, “Blow up - depois daquele beijo” aborda, de maneira experimental e vanguardista, conceitos de fotografia em um plano audiovisual. Assim, traz ao público reflexões sobre as características da imagem fixa.

No período em que o filme foi gravado, Londres se consagrava como uma capital artística mundial: músicos, artistas, poetas e cineastas de todo o mundo produziram na cidade. Era um momento de experimentação e descoberta, sobretudo no cinema. Antonioni inovou ao se “distanciar” dos padrões clássicos da época em narrativas com começo, meio, reviravolta e fim. Ele e outros diretores da geração italiana neorrealista desenvolveram uma dramaturgia na qual a figura do herói também já não tinha a mesma representatividade.

Destaca-se um questionamento: a ampliação da imagem variadas vezes aproxima ou distancia o fotógrafo da realidade? Em outras palavras, o aumento e o recorte distorcem ou esclarecem o real? Uma das discussões centrais propostas pelo filme é o nível de veracidade da fotografia. Isso aparece quando Bill (John Castle), pintor amigo de Thomas (David Hammings), explica que as telas que ele pinta nem sempre têm um significado planejado. Depois de algum tempo, ele repara aspectos nesses quadros que antes não via, o que agrega sentidos.

















Outra possível discussão refere-se ao que seria a realidade e o que seria devaneio de Thomas. Na última cena do filme, ouvimos o som das raquetadas na bola em uma partida de tênis imaginária, encenada por mímicos. Antonioni, de forma perspicaz, deixa questões em aberto. É possível defender diversas interpretações da “verdade” por trás da história, todas com conclusões “possíveis e prováveis”.

Também há metáforas do que seria a representação da fotografia no audiovisual. Por exemplo, a escolha de um grupo de mímicos na abertura e no encerramento do longa pode ser associada à ausência de áudio nas fotografias. A cena do show de rock permite a relação com o conceito fotográfico da “apropriação” fornecida pelas fotos ao registrar momentos. Em outras palavras, é como se a guitarra quebrada significasse para o público o mesmo uma fotografia do show, uma espécie de lembrança.


O olhar de Thomas também merece destaque: não poucas vezes, sugere a visão do diretor sobre determinada cena. Quando o fotógrafo olha uma paisagem e procura o melhor ângulo para registrá-la, vemos na tela uma imagem equivalente à pensada pelo fotógrafo. Não é à toa que o longa conquistou o Grand Prix do Festival de Cinema de Cannes de 1967. Antonioni inovou e agregou ao cinema características e reflexões à frente daquele tempo. Foi um pioneiro na linguagem cinematográfica com recursos que até hoje influenciam a produção audiovisual.


Mil frames que não valem um

Por Gustavo Andrade, sexto semestre


A ideia é passar uma estética fotográfica ousada. O filme retrata a vida de um fotógrafo sem graça, arrogante, aparentemente bem-sucedido, mas um babaca por isso. Elementos centrais do conto de Cortázar são retomados, como o jovem fotógrafo à procura de quebrar o nada com fotos. Porém, no conto ele é um amador e no filme um profissional. As personagens encontradas no parque mudam: no conto é uma mulher mais velha e no filme é um casal. O texto literário e o cinematográfico tratam das possibilidades de realidade que a fotografia pode sugerir, mas o conto é infinitamente melhor que o filme.

Por quê? Porque apesar de não ter uma só imagem, ele tem uma história envolvente, já o filme... O roteiro foge de Paris (a do conto) e vai para a cinzenta Londres, onde mal tem sol, portanto o parque é tão sem vida que as cores não despertam atração. Thomas é só um fotógrafo que tira fotos plásticas de modelos plásticas que apenas ganham vida diante das câmeras. Elas são tratadas feito objeto, usam roupas exageradas (parabéns à direção de arte pelas roupas), interpretam papéis patéticos e submissos. A narrativa expõe um machismo bobinho do fotógrafo exigente que faz o que quiser com as modelos fotografadas e se passa por galanteador.

O ritmo é lento, monótono e, por mais que possa sugerir mil e uma metáforas à fotografia, elas são cult demais, sem garantia de compreensão. Basta tirar o olhar da tela durante um segundo para se perder em uma trama que já foi feita para confundir. Cortes mirabolantes, cenas que parecem ter problemas de continuidade (como quando o protagonista entra em uma sala com um outro homem e, de repente, aparece deitado sozinho em uma cama). A foto tirada no parque de um casal, em que um homem armado escondido é revelado após a ampliação das imagens e, de tanto ampliar, não se sabe mais se há uma pessoa ali ou não, devido aos granulados da imagem. A mulher que persegue o fotógrafo e depois some, o homem morto que Thomas encontra no parque, o show de rock em que ninguém está se movendo, o braço da guitarra... Tudo é tão efêmero e sem graça que mesmo a fotografia do filme perde o efeito.

O diretor abusa de objetos artísticos para compor as cenas, mas eles parecem estar ali só por estar. Tudo parece ser puramente estético, por isso a sensação de futilidade e vazio, como uma fina camada de membrana ‘artística’ blasé elitista cujo conteúdo é dominado pelo vácuo. A arte parece não ter vida, apenas com o intuito de ser bonita.

O final até induz ao erro de forma legal, pois brinca com o acreditar que um jogo de tênis está acontecendo entre mímicos, mesmo sem a bolinha e as raquetes. Uma metáfora adequada da minha relação com Blow up: entediado depois de duas horas de filme, sei que há algo nele para se ver, eu só não consigo enxergar.

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